sexta-feira, fevereiro 29, 2008

Cuidado com a pizza

As pizzas congeladas trazem grandes quantidades de sódio e de gorduras. Nos rótulos, faltam informações sobre formas de armazenamento, SACs e reciclagem das embalagens

Sexta-feira à noite é hora de comer pizza. O cheiro da massa assada e do queijo derretido dão água na boca até quando a pizza é das mais simples. Mas... e se você soubesse que em apenas duas fatias vai consumir todo o sódio que comeria em 20 pratos – isso mesmo, 20 pratos – de filé de frango, brócolis, arroz, feijão e salada de alface, pepino, cenoura e beterraba? Talvez a vontade não diminua, mas é interessante saber o quanto dois pequenos pedaços nos trazem de calorias e de nutrientes. O Idec analisou o rótulo de 20 pizzas congeladas e encontrou quantidades absurdas de sódio e de gorduras saturadas.<br>
Em média, duas fatias contêm 1200 miligramas de sódio, metade do que um adulto pode consumir durante o dia todo. Além dos 20 pratos de filé de frango, a quantidade também é a mesma que se obtém comendo 6,5 pratos de bife à milanesa com arroz, feijão e salada de maionese. Ou, ainda, o mesmo que encontramos em 1,5 prato de macarronada a bolonhesa, caprichando no queijo ralado.

Já se o consumidor comer dois pedaços da pizza de mussarela das marcas Carrefour, CompreBem, Extra, Frescarini ou Wal-Mart, terá ingerido 65% do recomendado para o dia inteiro. E isso só em uma refeição. Essas são as pizzas que declaram maior quantidade de sódio por porção, chegando a 769 mg na fatia da Frescarini.

As que declaram menor quantidade de sódio por pedaço são as pizzas de marca própria do supermercado Dia%. A de mussarela contém 340 mg e a de calabresa, 337 mg. Só que, mesmo nessas, em apenas dois pedaços o consumo de sódio será o mesmo que em 8,5 pratos de estrogonofe de carne com arroz e batata frita. Ou o mesmo que se obteria depois de comer quatro pratos de filé de peixe frito, com arroz à grega e quatro colheres bem cheias de purê de batata.

De acordo com Deborah Bastos, agrônoma e professora da Faculdade de Saúde Pública da USP (Universidade de São Paulo), o sódio conserva o alimento, pois diminui a atividade da água e, assim, impede o crescimento e a proliferação de microorganismos. Também é usado para realçar o sabor dos alimentos e por isso o encontramos em quantidades tão grandes nos produtos industrializados.

O problema é que a ingestão exagerada do nutriente pode levar à hipertensão arterial, doença que acarreta problemas cardiovasculares e aumenta a retenção de líquidos, contribuindo para a obesidade. E quem está acima do peso, independentemente da idade, tem mais chances de ter problemas ortopédicos, respiratórios e gastrintestinais. É motivo suficiente para os consumidores mais radicais nunca mais colocarem um pedaço de pizza na boca. Mas como se alimentar também é sentir prazer com a comida, a dica não é deixar de comer. É só não exagerar, e equilibrar o consumo de alimentos como pizzas congeladas com o de legumes, verduras e frutas.

Recheio gorduroso

Das 20 pizzas analisadas (das marcas Batavo, Dia%, Carrefour, CompreBem, Extra, Frescarini, Pão de Açúcar, Perdigão, Sadia, Sonda e Wal-Mart/Great Value), 13 têm quantidades bem grandes de gorduras saturadas. As campeãs são as de mussarela da Sadia e da Perdigão, respectivamente com 20 g e 11,4 g de gorduras saturadas em apenas duas fatias. Como a recomendação de ingestão diária é de no máximo 22 g, se o consumidor comer duas fatias da pizza de mussarela da Sadia, não poderá ingerir mais nenhum alimento com gorduras no dia, o que seria bem difícil.

A mesma quantidade de gordura saturada (20 g) é encontrada só em dois dos pratos mais calóricos da culinária brasileira: o virado à paulista (com tutu de feijão, lingüiça, bisteca, banana empanada, ovo frito, torresmo e couve) e a tradicional feijoada (com arroz, feijão, carnes, torresmo, couve e laranja).

No geral, as pizzas de mussarela contêm mais gorduras que as de calabresa, diferente do que se possa imaginar. Por isso, é importante conferir os rótulos e escolher os sabores também pela quantidade de nutrientes que possuem.

Já quando analisamos as gorduras trans, as pizzas de marca própria do supermercado Dia% são as piores. Duas fatias – seja de mussarela ou de calabresa – contêm 1,5 g de gorduras trans, grandes responsáveis pelo aumento do colesterol ruim e pela incidência de doenças cardíacas. Não há recomendação diária desse tipo de gordura para um consumo seguro, mas o limite estabelecido pela Organização Mundial da Saúde (OMS) é de 2 g por dia.

Em dois pedaços das pizzas do Dia%, o consumidor vai ingerir a mesma quantidade de trans que há em 25 pratos de filé de frango com brócolis, ou ainda, o mesmo que há em 6,5 pratos de lasanha ao sugo feita em casa, com recheio de presunto e queijo, molho de tomate e queijo parmesão ralado.

Como as gorduras trans também estão presentes em grande parte dos alimentos industrializados (como margarinas, cremes vegetais, biscoitos, sorvetes, salgadinhos, produtos de panificação e alimentos fritos), é difícil que no mesmo dia o consumidor não coma outros tantos gramas dessa gordura. A dica é ficar de olho nas pizzas que têm mais recheio, pois nessas as chances de encontrar altos teores de gorduras é maior, já que o queijo e as carnes são alimentos ricos nessa substância.

Rótulos ruins

Infelizmente, um rótulo não é bom apenas por ter fotos que dão água na boca. Algumas informações são importantes para o consumidor ter como optar por uma marca ou sabor, entre elas as formas de conservação e de preparo do produto, seu prazo de validade, a informação nutricional por porção, os ingredientes da massa e do recheio, e os dados do fabricante, junto com um telefone para contato dos consumidores.

O artigo 31 do Código de Defesa do Consumidor (CDC) garante que “a oferta e a apresentação de produtos ou serviços devem assegurar informações corretas, claras, precisas, ostensivas e em língua portuguesa sobre suas características, qualidade, quantidade, composição, preço, garantia, prazos de validade e origem (...)”. Assim deveria ser, mas na prática muitos problemas ultrapassam o CDC e continuam nas prateleiras dos supermercados.<br>
O problema começa com o tamanho das porções indicadas, que varia entre 40 g e 200 g. A (des)informação dificulta a escolha, pois é necessário fazer diversas contas para saber qual é a pizza mais indicada para cada tipo de alimentação.

Para quem tem restrições alimentares, a situação é ainda pior. Um consumidor hipertenso que decide comer pizza deve ter cuidado para que sua pressão não sofra com a escolha. Para isso, ele procura uma que tenha baixa quantidade de sódio. Como não é especialista no assunto, encontra a pizza de calabresa do Sonda, que informa ter quantidade menor do que cinco gramas do nutriente, e a coloca no carrinho. No entanto, a embalagem apresenta um erro grotesco: o sódio é medido em miligramas, ou seja, ter quantidade inferior a cinco gramas significa ter menos do que 5 mil miligramas de sódio, quantidade maior do que o indicado para ser consumido em dois dias! Nesse caso, se o consumidor sofrer qualquer dano por causa da ingestão do alimento, poderá reclamar seus direitos para a empresa.

Da mesma forma, a pizza de calabresa da Perdigão não informa a quantidade de sódio, mas coloca a quantidade de cálcio na tabela de informações nutricionais. O consumidor pode se perguntar se a empresa errou o nome do nutriente ou se de fato não informa a quantidade de sódio (o que é obrigatório). Novamente, não estará certo sobre a informação nutricional correta.

Já as pizzas do Pão de Açúcar informam apenas os ingredientes do recheio. Como o consumidor não vai jogar a massa no lixo para comer só a mussarela, deveria encontrar informações também do que compõe o “disco de pizza”, como é listado.

As formas de conservação também são pouco esclarecedoras em oito das embalagens, que indicam apenas a temperatura para armazenamento. O Idec considera que uma boa indicação de armazenamento deve trazer não só a temperatura, mas também o local em que o consumidor obtém essa temperatura: se na geladeira, no congelador ou no freezer.

Os problemas continuam na hora de reclamar de irregularidades ou de pedir esclarecimentos às empresas. As pizzas do Pão de Açúcar não indicam o endereço da empresa e as do Sonda não informam o telefone do Serviço de Atendimento ao Cliente (SAC).

O Idec também conferiu quais empresas têm se preocupado com a preservação do meio ambiente e a constatação é ruim. Apenas as embalagens das marcas Batavo, CompreBem, Extra e Wal-Mart/Great Value informam que podem ser recicladas.

Válido até 2009

Há dez anos, o Idec fez um teste com massas de pizza e, na época, era preocupante a quantidade de conservantes usada para garantir o prazo de validade, que chegava a dois meses. No caso da atual pesquisa com as pizzas congeladas, os prazos de validade variam entre dois e cinco dias (para as pizzas refrigeradas do Pão de Açúcar e do Sonda, respectivamente) e um ano (para as pizzas congeladas do Dia%). É fundamental prestar atenção a essa informação, para não ingerir um alimento estragado.

Como nos rótulos atuais não encontramos informações sobre conservantes, entramos em contato com todas as empresas, para saber o que havia mudado nesse tempo. As que nos responderam até o fechamento desta edição foram:

» Compre Bem, Extra, Pão de Açúcar e Sadia, que informaram não utilizar conservantes em suas pizzas. As empresas afirmaram que a conservação nas temperaturas indicadas já garante a preservação dos produtos. De fato, hoje existem técnicas de processamento que permitem conservar o alimento sem adicionar conservantes, mas isso só acontece se a temperatura de conservação for seguida rigorosamente tanto pelos pontos de venda quando pelo consumidor

» Batavo e Perdigão, que informaram usar o sorbato de potássio como conservante: “devido aos problemas na cadeia de frio (pontos de venda) se faz necessária a aplicação de conservantes como o sorbato de potássio, que tem como função o controle do crescimento microbiano, em concentração permitida pela legislação vigente”

*Reportagem também publicada na edição de fevereiro da Revista do Idec